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“Levantou-se e partiu apressadamente…”
O tema das Jornadas Mundiais da Juventude deixa-se aprofundar apenas depois de termos enfrentado algumas questões incontornáveis:
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- O que nos faz levantar?
- E partir?
- E partir apressadamente?
- Qual é o alcance máximo dessa expectativa que se projeta para diante, para cima, para todos os lados?
- O que demanda, na sua máxima ousadia , o anseio humano?
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A resposta a estas questões daria a medida da amplitude do nosso máximo horizonte.
Cada um de nós, em momentos limite da sua aventura pessoal, descobre que se faz ao largo de tudo; admira-se ao constatar que se adianta para além da segurança da própria vivência acumulada ao longo dos seus anos; espanta-se com a agilidade com que se desembaraça para lá da estabilidade do conhecido, que afinal tinha se vindo a construir laboriosamente e formava o alicerce do seu quotidiano.
“Levantou-se e partiu apressadamente em direção às montanhas”
Os dois movimentos livres nesta iniciativa são “Levantar-se” e “Partir.”
O ímpeto que borbulha e lança espuma, no nosso levantar, é já resposta a uma solicitação que vem de mais longe? E De quão longe?
De quanto mais longe somos interpelados, talvez mais intenso o impulso do nosso levantar e a prontidão do pôr-se a caminho, e o ritmo do andamento para fora e para longe. Talvez se afine o olhar para a lonjura à medida que avançamos na direção de embora.
“Em direção” – não se trata de um rastrear avulso, mas de um movimento orientado, um ritmo ordenado, uma fidelidade a algo que nos expropria e nos transporta.
“Às montanhas” este destino último sugere um horizonte vertical, mais inacessível, mais exigente no esforço de chegar a participar nele, mais transcendente ao plano horizontal do habitat humano, onde a inércia do que já se controla com sucesso pode amortecer o ímpeto do avanço para diante.
E, no entanto, a prontidão da resposta e a orientação do olhar para o mais longínquo transmitem a sensação de que há algo de familiar neste apelo a uma superação sem condições.
Não no sentido em que o dom inesperado pudesse ser deduzido ou reclamado a partir de um indefinível anseio humano; mas antes essa impressão de “estar em casa”, apesar de estar fora das fronteiras patrulhadas.
É assim como uma sensação de pertencer ainda a outro enraizamento, para lá do ecossistema humano, no seu entrelaçamento íntimo de natureza e cultura – tão íntimo que as duas componentes se tornam indiscerníveis.
Um súbito à vontade reencontrado, mal se dobrou a curva do último limite conhecido, como se a nossa vocação humana tivesse sido, afinal, desde sempre, o incessante renovar-se em vista de um infinito: “levantar-se e partir”.
Santo Anselmo, no sec XII, deixou formulado para sempre um desafio semelhante a todo o pensar vivo que havia de vir depois dele; mas o seu convite ousado não se dirige ao pseudo-pensar de pacotilha, domesticado e passivo, segregando abstrações ou derramando-se em objetos externos.
Só o centro ardente da pessoa humana é capaz de unificar num feixe luminoso todas as vertentes da existência e determinar-se para a aventura de um pensar vivo.
Aventurar-se a pensar o ser; o ser maior; “o ser acima do qual nada maior pode ser pensado”. Anselmo desenhou um horizonte de amplitude tão aberta que não se pode percorrer as suas margens com o olhar.
Nada mais do que pensar a sua possibilidade é talvez já “o levantar-se” do nosso próprio ser; afirmar a existência dessa possibilidade infinita é talvez já o início de uma “partida apressada” de todo o nosso ser, a imersão na irresistível corrida em direção ao coração inatingível deste máximo horizonte .
JMJ-Lisboa-2023 – Agenda 22-23 – A VIDA – OE